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São João dos tambores: Conheça a história do samba junino em bairros populares de Salvador 

Por Laiane Apresentação / Eduarda Pinto

São João dos tambores: Conheça a história do samba junino em bairros populares de Salvador 
Foto: Secult / Bahia

Em meio as cores, sabores e sons da temporada junina no Nordeste, Salvador se tornou o polo de uma manifestação cultural que deixa de lado a sanfona, zabumba e o triângulo para dar ainda mais espaço para os tambores e palmas. O samba duro junino, variação estilística do samba de roda, se tornou uma tradição nos bairros populares da capital baiana. 

 

Após o Sábado de Aleluia e até 2 de julho, as comunidades de bairros periféricos da cidade aproveitam os ensaios, e logo em seguida o desfile, de grupos de samba junino. Há um mês do São João, o Bahia Notícias explora, neste sábado (24), a história, as singularidades, e as riquezas deste movimento. 

 

DO TERREIRO PRA RUA 

A origem do movimento não é precisa. No entanto, entre as mais diversas versões possíveis, um ponto em comum é a influência das sonoridades produzidas dentro das religiões de matriz africana, conhecidos como sambas de terreiro. A teoria é amplamente reforçada pelos pioneiros, entusiastas e pesquisadores do movimento. 

 

O professor de Música e Mestre em Etnomusiologia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Gustavo Melo, explica que o samba junino é mais próximo do Cabila, ritmo executado em terreiros, e samba duro, e teve origem no Samba de Roda.

 

“No samba junino é corrido. A gente sai e sempre foi assim, desde quando saiu dos terreiros e foi para as ruas, foi para ir para as casas das pessoas tocando timbal, batendo e, aliás, já teve um período que era feito com pratos”, explicou. 

 

Sendo o samba um tronco rítmico extenso que influenciou diversos movimentos, o pesquisador defende que a existência de tantas vertentes no samba é devido a modificações ocorridas em outras partes do país após o nascimento do gênero na Bahia. 

 

“Cada local tem a sua linguagem. Assim como na fala, a gente fala com sotaque diferente. Eu acho que é por aí. O samba junino vem do samba de roda. Mas é um gênero diferente do samba de roda, do Recôncavo, do samba chula. É diferente”, comentou. 

 

O fortalecimento do samba junino parte dos seus movimentos sociais. Um dos pioneiros nesse aspecto é o Festival de Samba Duro Junino do Engenho Velho de Brotas, realizado em 1978, pelos irmãos Mário e Jorge Sacramento, conhecidos como Mário Bafafé e Mestre Jorjão Bafafé. 

 

O evento iniciou com o desfile de grupos samba de rodas, e ao longo dos anos, novos grupos, com um samba mais cadenciado, foram acrescentados. Considerados os pioneiros do samba junino em Salvador, os irmãos relatam em primeira mão este processo. 

 

Netos de uma mãe de santo do bairro do Engenho Velho de Brotas, tradicionalmente conhecido pela resistência das manifestações culturais afro-brasileiras, a dupla conta que “relação com o samba é desde pequeno, desde menino". "Tinham muitos sambas aqui em casa e a gente acompanhava muito. E um belo dia nos resolvemos levar esse samba, que era oriundo do terreiro de candomblé, para a rua”, diz Mário, idealizador da Federação de Samba Duro Junino, que organiza anualmente o Festival de Samba Junino do Engenho Velho. 

 

Ao Bahia Notícias, ele relata a criação do projeto, que teve início em 1978 e este ano comemora 47 anos. “Normalmente, eu ficava daqui ouvindo uma zuada de tambor, e resolvi ver onde era esse samba. Era lá no alto do morro, no [na comunidade do] Alto da Bola. E depois tinha aqui também na Federação, o Samba Pé, e também o [samba] Leva Eu, aqui no Engenho Velho de Brotas”, detalha. 

 

“E eu fui, tive a ideia de fazer uma festa, comentei com Jorjão [Jorge Sacramento, músico e irmão de Mário] e nosso primo, Doca. Eu queria fazer essa festa e convidei os três [grupos de samba duro], eles retornaram e nós nos reunimos na estreia e eu tive a ideia de procurar saber da vizinhança de quem eles tinham gostado mais”, conta. Em 2025, o projeto, dirigido, atualmente, por cerca de 10 pessoas, já chega a sua 47ª edição.

 

Jorjão Bafafé destaca que “quando criávamos o primeiro concurso de samba duro, ele não tinha vez e nem voz, por isso que surgiu essa ideia". "Então a gente teve que se impor da personalidade e criar diversas formas de tocar, ele é diferente”, explica.

 

Para os irmãos, uma parte importante de sua manutenção vem da influência e a participação social da comunidade. “Somos diferenciados até para as suas músicas, como é cantada, é uma coisa ancestral mesmo. São músicas feitas com a nossa identidade, falando da nossa terra, falando do nosso convívio, no sentido de divulgar mesmo o São João da gente. Não é um São João que tem sanfona, zabumba, é um São João que tem tambores”, delimita. 

 

Foto: Divulgação 46° Festival de Samba Junino / Federação de Samba Duro Junino da Bahia. 

 

A relação do samba junino com a ancestralidade afro-brasileira e com as periferias também fortaleceu a sua popularização e formação de artistas vinculados ao movimento. É o que explica o pesquisador Gustavo Melo. 

 

HERANÇA DO SAMBA JUNINO

Na mesma periferia em que o movimento se torna conhecido, novas manifestações vão sendo formadas a partir dele. Com sua influência pulsante, os herdeiros do samba duro ou samba junino já colhem seus frutos. Nomes de destaque da música baiana, no Axé Music e no pagodão, iniciaram sua trajetória na arte dentro dos grupos de samba junino de seus bairros. 

 

Tonho Matéria, Beto Jamaica, Márcio Victor, Neguinho do Samba e Tatau são alguns dos artistas que vieram do movimento. Ao Bahia Notícias, o professor Gustavo Melo explicou que a própria origem do ritmo diferente do É o Tchan surgiu após a participação de membros do antigo Gera Samba nos ensaios de Samba Junino da Liberdade. 

 

“Quando o Gera Samba apareceu, ele utilizava músicas de um grupo de samba junina aqui do Salvador, que é o Samba Fama, que era um grupo de música de samba de roda [fundado em 1979, no Alto do Cantois], samba de terreiros e eles pegaram e adaptaram [a música]”, contou Melo. 

 

Entretanto, a influência é, para Melo, uma “via de mão dupla”. “Do mesmo jeito que os blocos afro influenciaram muito samba junino, porque deram essa coisa de pertencimento. Você vê outros blocos surgindo, o Ilê Aiyê surgindo, o Olodum depois. Isso faz com que movimente a população afrodescendente, negra, a fazer algo”, afirmou.

 

Vagner Shrek, gerente de projetos da Liga de Samba Junino, fundada em 2011, defende que o samba junino é um “conservatório de música na periferia”. Mais do que uma festa ou manifestação cultural, tombada como Patrimônio Cultural Imaterial de Salvador, o Samba Junino é espaço para jovens aprenderem a compor, cantar e tocar instrumentos, das pessoas curtirem shows gratuitos e do comércio local ser aquecido durante sua realização. 

 

“É um movimento de rua. As pessoas não pagam o ingresso para participar dos ensaios de samba junino. Ele é feito na comunidade, levando entretenimento e cultura para aquela população carente que muitas vezes não tem dinheiro para ir para um show”, explicou Shrek. 

 

SAMBA DA RESISTÊNCIA

Apesar das similaridades entre os diversos movimentos oriundos do samba baiano, os irmãos Bafafé defendem que a delimitação do samba junino, com suas especificidades e necessidades, é necessário para garantir sua sobrevivência. 

 

“Nós colocamos [o nome] de Samba Duro Junino justamente para estancar o pagode, e aqui com a gente só participa samba junino. A gente sabe o que é samba junino e sabe o que é pagode. Até porque, quando vocês estão lá fazendo pagode, vocês não convidam o samba junino, e como é dia do samba junino e nós vamos botar pagode? Não tem nada a ver”, destaca. “Nós não vamos jogar por água abaixo uma coisa que nós criamos”. 

 

Jorge complementa: “O tambor é a nossa identidade cultural e musical e hoje nós estamos tendo o devido reconhecimento para isso não se perder”. 

 

Foto: Secom /  Prefeitura de Salvador 

 

O mesmo posicionamento é reforçado por Vagner Shrek: “O samba junino não é qualquer grupo de samba que se manifesta no período junino. Ele tem características próprias do segmento, a utilização do timbal, do tamborim, do surdo, é a característica do instrumento. A questão das indumentárias, o samba junino geralmente ele traz temas para a rua”, aponta. 

 

“Um grupo de partido alto que sai no período junino fazendo a manifestação é lindo. É uma manifestação cultural, maravilhosa e importante, leva entretenimento, cultura, mas não é de Samba Junino”, completa o representante da Liga de Samba Junino. 

 

Músico, Melo ressalta que a presença desses grupos é preocupante. “Eles já tem outra história, são tradições diferentes. Então, se a gente busca algo para preservação, se esses grupos penetram dentro da nossa manifestação cultural, da nossa festa, da nossa brincadeira, pode atrapalhar”, esclareceu. 

 

SAMBA JUNINO E FORÇA ATUAL

Apesar de ainda presente em grandes bairros da cidade, a manifestação enfrenta desafios para sua manutenção. Para Vagner Shrek, a falta de incentivo público é um deles. O Festival realizado pela Liga precisou de uma pausa no último ano, devido à falta de investimento e patrocínio.

 

“Não é só o fato de se registrar [como Patrimônio Cultural Imaterial] e botar em papel que vai fazer um milagre e fazer com que o samba junino prospere. É necessário que haja um investimento, que haja um interesse social nisso. Porque assim como hoje, a exemplo, o governo do Estado patrocina os blocos afros, com o Ouro Negro, é preciso ter uma versão do ouro negro no São João”, defendeu. 

 

Neste ano, o evento retorna com o apoio da Fundação Gregório de Mattos (FGM), através do edital “Samba Junino - Ano VII”. Segundo Vagner, o evento recebeu um aporte de R$ 50 mil para sua realização, mas não é suficiente para pagar cachês e a estrutura necessária para as apresentações. 

 

“A gente vai montar uma estrutura de palco, com LED, com tudo isso e uma premiação de R$ 10.000 para poder contemplar aqueles grupos premiados por conta de não poder pagar um cachê a todos os grupos”, explicou. 

 

O edital da FGM apoia ainda a 47ª edição do Festival de Samba Junino do Engenho Velho de Brotas, organizado pela Federação de Samba Duro Junino do Estado da Bahia. Mas para Gustavo Melo, a falta de incentivo público e privado não é a única preocupação: a ausência de novos nomes para ar a tradição adiante também alarma.

 

“A minha preocupação é quanto a surgimento de novos é personagens que possam estar levando essa coisa para frente. Muitos dos que eu conheço é da velha-guarda, as pessoas mais antigas, elas ainda estão fazendo esse movimento acontecer. Aí, surgem novos nomes, mas eu acredito que ainda muito pouco”, itiu.

 

E, em mais um cenário, os irmãos Sacramento são pioneiros. Além de produtores culturais, a dupla atua como liderança comunitária, incentivando a ocupação de jovens e crianças mediante participação no festival anual. 

 

“O nosso trabalho aqui é com meninos jovens de 07 a 14 anos, a gente conversa, bate-papo e esse ano estamos fazendo um samba-mirim com eles. Eles que vão abrir o São João, no dia 23 [de junho], ensaiamos todo sábado com eles. No último sábado aqui tinham 14 meninos, fora os que estavam olhando e querendo participar também. Estamos trabalhando para colocar eles [no projeto], porque estão interessadíssimos”, reflete Mário Sacramento. 

 

Foto: Divulgação 46° Festival de Samba Junino / Federação de Samba Duro Junino da Bahia. 

 

Para Shrek, os jovens envolvidos com o movimento do samba junino afastam-se da criminalidade. “O jovem, ele sabe a importância reconhecer a importância dessa cultura na comunidade dele. Ele sabe o peso que tem aquilo para a mãe dele, do pai, dos irmãos e para ele próprio. Então, ninguém vai precisar do menino brigar, fazer violência”, defendeu. 

 

Um dos exemplos dados por Shrek é a ausência de registros de violência durante os arrastões de samba junino. “São 25 anos sem uma ocorrência policial grave. A última ocorreu no bairro de Engenho Velho de Botas, o qual estão aqui até agora e ela tem mais de 25 anos”, contou. 

 

Esse formato comunitário e socialmente engajado de trabalhar também é um dos pilares do samba junino, defende Jorge Bafafé. “A gente não cria essa forma de fazer o São João da ancestralidade, o São João afro, a gente estaria fora, fazendo zabumba, mas aqui no bairro [o que predomina] é o samba. Tudo por essa criatividade que nós temos, a comunidade, a negrada tem essa criatividade. Somos muito culturais, a gente só não tem dinheiro. A gente tem a cultura e por isso a gente não abre mão”, finaliza. 

 

Os ensaios dos grupos de samba junino começaram em abril, com o Sábado de Aleluia, mas os festejos de samba junino em Salvador tem início em junho, entre desfiles, shows, competições e outros tipos de eventos comunitários e populares, eles dão régua e como para as comemorações juninas na capital baiana e toda a região.

 

 

(Reportagem atualizada ás 13h27 para correção do cargo de Vagner Shrek e do valor do edital "Samba Junino - Ano VII" )